#Inova- Além do arroz nosso de cada dia: a química e alguns usos da casca do arroz
Além do arroz nosso de cada dia: a
química e alguns usos da casca do arroz
Escrito por: Geovana Silva Faustino
Nas últimas décadas o descarte
indevido de resíduos agro-industriais, tem gerado impactos negativos no
ambiente e podem provocar diversos tipos de danos, como a infertilidade do
solo, erosão, desequilíbrio ecológico, empobrecimento da vegetação, contaminação
de alimentos e problemas de saúde pública. Consolin Filho et al. (2018) argumentam que esse é um problema mundial crescente e
a utilização “desses resíduos é de
extrema importância, já que resulta na redução de impactos ambientais,
preservação da saúde da população, e permite agregar valor à esses materiais
(CONSOLIN FILHO et al., 2018, p.2)”.
Nesse
sentido, com uma produção anual de cerca de 10 milhões de toneladas de arroz, o
Brasil ocupa o nono lugar na lista dos produtores mundiais desse cereal. Em 2019,
segundo a Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (EMBRAPA) foram cerca de 10, 300 milhões de
toneladas, sendo o maior produtor o estado do Rio Grande do Sul, com produção
em torno de 7 milhões de toneladas (EMBRAPA, 2020). Estima-se atualmente uma
produção mundial de 500 milhões de toneladas de arroz por ano (SATO; REIS,
2020), o que gera um grande volume de grãos e consequentemente de cascas deste
produto.
Em
decorrência desse volume, muito se tem pensado sobre possíveis destinos e
várias outras utilizações, para além do descarte dos resíduos, como o uso das
cinzas da casca do arroz na construção civil, a produção de biomassas e a
extração de sílica (FIGURA 01). Segundo Foletto et al. (2005, p. 1059), a casca de arroz é considerada também “o
resíduo vegetal que mais produz cinzas ao ser queimado”, o que torna importante
considerar sua transformação em materiais, por meio de pesquisas, que possam
ser usados em outros fins.
Figura
01: Principais aplicações para a casca de arroz.
Fonte:
Extraído de Silva (2009, p.36).
Com
relação às propriedades químicas da casca do arroz, Diniz (2005) salienta que o
solo pode afetar gradativamente a composição da casca de arroz. Um dos
principais componentes da casca é a celulose, lignina, hemicelulose e minerais.
A queima da casca de arroz pode ser feita pela pirólise (que é um processo
termoquímico de decomposição) da biomassa sem a presença de oxigênio. Após a
casca de arroz passar por este processo de pirólise ela gera: Bio-óleo, Carvão
Vegetal (usado como adsorvente de poluentes) e Gases. O Bio-óleo é composto
por: água, ácidos carboxílicos, álcoois, aldeídos, cetonas, ésteres, éteres,
fenol e furanos. Os gases produzidos na pirólise da casca de arroz são: Metano,
Hidrogênio, Dióxido de Carbono e Monóxido de Carbono (DINIZ, 2005).
Quanto
a aplicação, Foletto et al. (2005)
expõem que as cinzas da casca do arroz (FIGURA 02), podem ser usadas na
construção civil, na produção de concretos de grande desempenho, resistência e
durabilidade, isso porque
o
uso da cinza de casca de arroz como fonte de sílica no cimento diminui a
resistência à compressão, aumenta a durabilidade do concreto e reduz a
porosidade, o que é extremamente importante em muitas aplicações, tais como
canais de irrigação, concretos resistentes à poluição e às intempéries, pisos
resistentes à abrasão, etc (FOLETTO et al.,
2005, p. 1057).
Figura
02: Cascas e cinzas de casca de arroz queimadas
Fonte:
Extraído de Hotza (2006, p.1176).
Além
do cimento, a casca do arroz também pode ser utilizada para dar mais
estabilidade em borrachas. Segundo Foletto et al. (2005), vários compostos de
borracha necessitam de complemento para que esta tenha mais estabilidade,
dureza e elongação e a adição das cinzas de casca de arroz começaram a ser
usadas por volta de 1975 como carga em polímeros. As cinzas também podem evitar
o transpasse de gases como oxigênio e dióxido de carbono na borracha (FOLETTO et al., 2005).
Outra
utilização para a casca de arroz é a produção de sílica (SiO2 -
Dióxido de Silício), já que 95% da casca seca é composta dela. Segundo Foletto et al. (2005, p. 1056) “a cinza da casca de arroz pode conter até
15% em peso de carbono. Se o aquecimento for promovido com a finalidade de
eliminar este carbono residual, o aquecimento indicado para tal feito é de
200°C. Pode-se obter aproximadamente 95% de sílica pura”. A sílica pode ser
usada como secante, matéria prima na produção de vidros e cimentos, o que torna
o resíduo da casca queimada do arroz, um produto vantajoso.
Por
fim, outro uso da casca do arroz é a produção da biomassa, que pode ser usada
na produção de energia. Boaretto (2014) salienta que é necessário buscar
soluções mais viáveis na produção de energia, já que o seu consumo vem
aumentando gradativamente. Segundo a autora,
a
biomassa insere-se como uma importante alternativa para tal substituição, e,
dentre as biomassas provenientes de resíduos agroindustriais, apresenta-se a
casca de arroz que possui um imenso potencial devido sua produção no País e por
seus resíduos serem descartados sem finalidades mais eficientes (BOARETTO,
2014, p. 5)
Além
disso, Boaretto (2014) ainda afirma que, como a casca do arroz possui baixa
umidade e grande quantidade de carbono, ela supera a quantidade de energia
liberada na queima em relação a outras biomassas, como a da cana-de-açúcar e da
madeira, além do resíduo da queima ser usado para outros fins, como discutido.
Nesse sentido, vimos a importância dos estudos relacionados aos materiais que a princípio seriam descartados. Esse processo de estudos científicos depende da Química de Materiais, ramo da química que procura estabelecer relações entre a Física, Biologia, Engenharia e outras áreas do conhecimento. A união destas áreas possibilitou desenvolver e entender novos materiais e sistemas que contribuem para o avanço da nanotecnologia e a utilização de produtos naturais. E você, imaginava ser possível fazer tantas coisas com as cascas de arroz?
Referências
Bibliográficas
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de geração de energia proveniente da casca de arroz. 2014. 52 f. TCC
(Graduação) - Curso de Engenharia Ambiental e Sanitária, Universidade do Sul de
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CONSOLIN FILHO, N.; FURLAN, F. L.;
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(Mestrado em Engenharia Civil) - Universidade Estadual Paulista, Ilha Solteira,
2009.
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