#PIBIDFLIX - Por que a arte de Van Gogh está perdendo sua cor?
Por
que a arte de Van Gogh está perdendo sua cor?
Escrito por: Déborah Fernanda Leite
Rossi
Você já imaginou que
existem relações entre a ciência e a arte? Vamos ver nesse texto como uma pode
explicar a outra. Vicent Van Gogh (1853 - 1890), foi um pintor holandes do
período pós-impressionista (FRAZÃO, 2021) que teve bastante influência da
química em suas obras. Sua carreira como pintor teve início na década de 1880 e
ao ter crises psicóticas, em 1889 o pintor foi internado e, então, surgiram
suas mais famosas obras, caracterizadas por intensas pinceladas e fortes cores.
No dia 29 de julho de 1890, Van Gogh tirou a própria vida. A fama só veio após
sua morte, havia na época mais de 700 obras amontoadas sem comprador. Mas com o
passar do tempo, as cores tão intensas e características dessas obras que hoje
são muito famosas estão sendo alteradas.
Na época, Van Gogh,
passou a enxergar o mundo como se tivesse um filtro amarelo por conta de uma
contaminação por dedaleira, uma planta medicinal usada para casos de
insuficiência cardíaca, na época usada para tratar doenças psíquicas, que se
administrada de maneira incorreta acaba se tornando letal. Essa é uma das
hipóteses que explica o fato da cor amarela ser tão predominante em suas obras,
tendo em vista que era a maneira que ele enxergava o mundo e procurava buscar a
calma (GONZÁLEZ, 2020). Sua doença era considerada de grau moderado, portanto,
eram utilizadas outras tonalidades em suas pinturas, conforme pode ser
observado nas telas apresentadas abaixo.
Figura 01: O escolar (O filho do
carteiro - Gamin au Képi), 1888. A obra encontra-se no Museu de Arte de São
Paulo (MASP).
Figura 02: A noite estrelada, 1889. Está exposta no museu de Arte
Moderna em Nova York (MoMA).
Figura 03: Doze girassóis numa
jarra, 1888. Localizada em Neue Pinakothek, em Munique, Alemanha.
Mas afinal, porque está ocorrendo
alterações nas cores nas obras de Van Gogh?
Em um estudo realizado
por pesquisadores do Grupo de Física Nuclear Aplicada da Universidade
(GFNA/UEL), investigou-se a
composição das tintas por uma técnica chamada Fluorescência de raio X portátil
(PXFR). Esse método consiste em medir a intensidade da luz e comprimento de
onda emitido pelos átomos da amostra, podendo determinar exatamente a
composição química nas camadas da pintura. Os autores divulgaram os resultados
no artigo Pigment analysis in four
paintings by portable X-ray fluorescence (PXFR), concluindo que havia na
composição das tintas: Cromo, Chumbo e Enxofre na cor amarela; Cobre no verde
esmeralda; e Zinco no branco (MOLARI e APPOLONI, 2020).
Os pigmentos utilizados
na época também continham Cromato de Chumbo (PbCrO4); Sulfato de
Chumbo (PbSO4); e Sulfato de Cromo [Cr2(SO4)3],
entre outros (FIGUEIREDO; ANSELMO; COSTA; SANTANA, 2016), que estão
contribuindo para que ocorra o escurecimento das obras por meio da oxidação, na
época não se tinha estudos sobre qual tinta teria melhor durabilidade com o
tempo.
A partir da compreensão sobre a composição química das tintas utilizadas pelo pintor é possível entender o porquê está acontecendo tais mudanças na coloração. As alterações ocorrem por conta de processos de oxidação e redução desses compostos. Por exemplo, a cor amarela, presente em parte das obras, por conter cromo quando reage com os raios ultravioletas acaba passando por um processo de redução do Cr (VI) para o Cr (III), mudando sua tonalidade de amarelo luminoso para um amarelo com um tom marrom, conforme apresentado na reação abaixo:
Mas não foi só por conta das tintas utilizadas na época que as criações mudaram de cor. Por exemplo, o quadro “Os girassóis”, sofreu o processo de oxidação, pois continha cádmio em sua composição e quando reage com o oxigênio presente na atmosfera, perde elétrons, aumentando o número de oxidação, o que ocasiona a alteração da sua tonalidade e perda da luminosidade. Assim, foi aplicado um verniz, para impedir o contato da tinta com o oxigênio, no entanto, esse verniz reagiu com o chumbo, também presente na composição química da tinta e fez com que a cor passasse por outras alterações. A artista Charlotte Carpers reproduziu as cores que originalmente teriam sido utilizadas pelo artista e comparou com as cores atualmente observadas na pintura, exposta no museu Van Gogh, conforme mostrado na imagem abaixo.
Figura 04: Reprodução das cores
originais da pintura “Os girassóis” (Fonte: EL PAÍS, 2019).
Esses conhecimentos,
além de interessantes, podem se tornar motivadores da aprendizagem de conceitos
químicos. As professoras Michele Reis e Mara Braibante aplicaram em uma escola
Estadual do município de Santa Maria - RS, uma oficina temática sobre tintas,
onde os alunos puderam discutir sobre a vida e as obras de Van Gogh. Por meio
de atividades teórico-práticas, os estudantes puderam compreender a respeito
dos conceitos químicos envolvidos nessa temática, além de reproduzir uma das
obras do pintor (REIS e BRAIBANTE, 2018).
A partir desse texto, é possível perceber inúmeras relações entre a química e a arte, se configurando também como uma possibilidade de discussão de conceitos científicos de maneira interdisciplinar. Compreender sobre a composição química das tintas, os processos químicos que ocorrem no decorrer do tempo e a influência dessas reações nas cores observadas nas pinturas de Van Gogh é a arte da ciência. Como cita Fernando Pessoa: “A ciência descreve as coisas como são; a arte, como são sentidas, como se sente que são”.
Referências Bibliográficas
FIGUEIREDO, A. D. P.; ANSELMO, C. M.; COSTA, A. S. B.; SANTANA, G. P. Interagindo arte e química na abordagem de óxidos. Scientia Amazonia, v.5, n.2, 54-58, 2016.=
FRAZÃO, D. Vicent van Gogh. Ebiografia. 28 de maio de 2021. Disponível em: https://www.ebiografia.com/van_gogh/, acesso em 15 set. 2021.
GONZÁLEZ, R. R. Por que Van Gogh usava tanto amarelo em suas pinturas, segundo a ciência. BBC NEWS / BRASIL, 19 de novembro de 2020. Disponível em: https://www.bbc.com/portuguese/internacional-54948162, acesso em 15 set. 2021.
MOLARI, R.; APPOLONI, C. Pigment analysis in four paintings by Vicent van Gogh by portable X-ray fluorescence. Radiation Physics and Chemistry, dezembro, 2020.
REIS, M. T.; BRAIBANTE, M. E. F. O ensino de química e arte por meio da temática “tintas”: uma abordagem interdisciplinar. REDEQUIM, ISSN: 2447-6099, 24 de setembro, 2018.
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